RESTO DE TOCO, POUCO SOZINHO
Pensei muito
em começar esta escrita com alguma palavra de efeito. Talvez desse certo. Ou
não. Mas já são tantas expectativas diariamente. Todas as manhãs nos prometemos
algo de difícil realização. Tantas metas. Listas feitas em papeis de rascunho
que acabam sendo guardados no bolso. O que seria da vida sem as ambições? A
psicologia nos explica que muito enganador é o cérebro. O sabichão. No outro
dia, ocultamos tudo que passou e avançamos na peça em que nos colocaram de
atores. Para cada vida, um drama: que tem início, meio e por vezes, não chega
ter um bom fim. Final feliz? Isso é coisa de conto de fadas.
É pau, é
pedra, é o fim do caminho.
A lenha são dos
galhos da árvore cansada. O tempo corre tão depressa, que quem aproveita de sua
sombra, a esquece de regar. A coitada em desespero grita os sinais de que está
adoecendo. Mas o ponteiro do relógio é veloz demais. Rouba das pessoas o senso
de normalidade. São distraídos, iludidos e tristonhos. Enquanto isso, ela vai
empobrecendo, envelhecendo e continuamente, morrendo. É uma pena que deixemos nossos
jardins falecer.
As pedras são
destroços de rochas infinitamente maiores. Elas vieram rolando morro abaixo nos
perturbando com o barulho. Qual a escusa para que nossos ouvidos tapados não atentassem
ao desmoronamento? Elas chacoalhavam nossas estruturas! Os pedregulhos menores
viam fazendo tumulto na alma durante toda a estação, contudo costuramos
cortinas de grossa manta para que distante de nós se mantivesse os presságios.
O toque de recolher, as buzinas... Não é suficiente para que façamos a mala e
partamos embora? No entanto, pedregulhos não são bolsas de caridade e, um dia
se cansam e tombam junto ao grande rochedo do qual se desabotoou. O
arrependimento pousa instantaneamente e nos abraça para que encolhidos choremos
mais. Tão mais fácil seria se construíssemos nosso forte em terra firme,
resistente aos desabamentos!
E então, evidentemente
claro, pensamos ser o fim do caminho. E acredite. Não é! Fins de caminho
geralmente são repletos de muros, barreiras e matas escuras. E estes são
arduamente quebrados e adentrados pelos aventureiros colonizadores. Saem de
casa sem ao menos saber o que encontrar. E quando encontram, precisam saber
lidar. Daí, juntos e sempre juntos, planejam, oram, constroem táticas,
inventam... E batem, quebram, fragmentam, cortam e alteram. De repente, outra
paisagem. Se antes mata bruta, tapume forte, agora campo aberto. Ir e
destampar. Quem são os audaciosos criadores de trilhas nas nossas vidas? Se
alguém não tomar iniciativa, o grupo se desfaz.
Não há outro
meio. O adequado é entrarmos no bando dos reconstrutores. Recolher aqueles
cascalhos que se empoçou e agora nos cercam, e uni-los em edificação. Somos os
engenheiros de si. Arquitetos do que
mostraremos de fruto aos homens e a Deus. Minha morada não será na areia, que
quando a água molha, encharca e desmancha, destruindo as fundações do espírito.
Minha morada será edificada na rocha,
aquela mesma que toda se desabou e não mais falhará. Mesmo que a porta para a
sabedoria seja estreita, eu passarei e verei do outro lado luz. Muita luz.
Erguerei a fronte contra o sol e exclamarei: Eu venci!
Porque todo
recomeço é necessário. Porque todo recomeço é tortura. Ele nos prende em jaulas
apertadas e apontam, julgam, como se já não bastasse nossas consciências
machucadas que pesa segundo a segundo, minuto a minuto, nos enlouquecendo, nos
batendo. Quem está preso surra a caneca com as grades e lá dos céus surge a
salvação:
- Pedi, e
dar-se-vos-á; buscai, e encontrareis; batei, e abrir-se-vos-á.
E então recordamo-nos.
É ainda o papel que foi guardado no bolso. Sonhos anotados em rascunhos são
aqueles que em maior embrulho chegam. E quando chegarem, teremos assimilado que
o terremoto passou. As ondas se acalmaram. O céu se abriu. O dia chegou. E o
sossego também. Quão belo é a paz dos justos! Quão bom apreciar a voz que diz:
-Acalma-te
coração! Estas são somente as águas de março...
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