sábado, 22 de abril de 2017

O que houve aqui?


     É um tanto conflitante o desabafo de quem vive os sentimentos encarnados no tempo em que eles se manifestam. O extremo, o ápice, o clímax de qualquer manifestação de desejo inibe a máxima tentativa de racionalização nas ações de busca ao prazer. Em síntese: um processo de aprisionamento do indivíduo em questões ensimesmadas. Libertar-se é negar a natureza humana e fingir-se divino. Não somos, no entanto. Meu cúmulo de paixão, medo, sonho, tristeza, alegria, indagação, arrependimento, esperança, levam-me à situações indesejáveis visto à lógica mundana e, o questionamento impróprio de que se fiz o que fiz porque era-me o certo a fazer ou ainda se deixei de fazer porque deixando me sentiria mais próxima das convenções, só levaram-me ao ‘fundo do poço’.
    Esse não é e nem tenta ser (e ainda peço que não interpretem como tal) um discurso anarquista clássico ‘façam o que desejam fazer’. Há normas, princípios, condições (mesmo no sentido não alienante) de se fazer organizar e levar o mundo. Hoje, aqui, agora, o intuito é falar sobre aquele sentimento que desencaminha qualquer tentativa mínima de manter-se nítido, focado, limitado, vivo, dentro do juízo. Porque quando disse Vinicius ‘ai de quem ama’ e ainda quando completa com tamanha lindeza ‘Amar sozinho/ Ai de quem ama/ Vive dizendo/ Adeus, adeus’, nada mais fazia que rechaçar com a bomba congelante de seus versos – o amor. 
     Trago ao leitor a comodidade de assistir como mera ficção as dores intrínsecas dos amores finitos. Parto de mim, das dores minhas, únicas, subjetivas, amargas, miúdas em suas grandezas. Traguei tanto da fumaça da maldade, calei tanto sob o som da raiva. Chorei. Eu chorei tanto. É o que bem disse acima: erro no uso da razão. Sem querer, acabei transformando as calamidades da vida em poesia. Amar é também fazer isto.
     Carlos. Vamos dar o nome de Carlos ao sujeito. Carlos do germânico — o guerreiro. Nem soldado ou oficial, um medroso. Fui persistente por ele e por nós. Carlos do germânico — o homem. Homem, forte, protetor, amigo, amante. Quem dera! Carlos? Carlos de Carlos só tinha o nome. Uma pena... Só serviu de objeto de estudo. Nada científico, quanto menos as regras do positivismo mais válida minhas considerações. Dos fatos ao ciúme, das crises às conclusões: vive dizendo adeus, adeus!
    É...Ai de quem ama. E eu amei. Ai de mim! Pensava na melodia do Vinicius cada vez que ele vinha, todo Carlos, me fazendo esmorecer. Nada guerreiro, mas forçando-me à amar-lhe. Amei Carlos, com todas as forças. Carlos não via. Me dedicava tanto. Tanto. E eu questionando-me do que o amor fizera por aqui. Antes eu tivesse desviado dos teus olhares e me esquivado dos teus abraços. Se soubesse do trágico fim, tornava à próxima esquina para que não me visse, para que sumisse do meu destino. Antes eu estivesse solitária nas imaginárias declarações de Mr. Darcys, Johns e Wethers do que no apreciar da sua deliciosa voz. Carlos, como pôde ser tão estúpido? O que o amor fez por aqui? Antes eu o temesse como temi os homens da vida. Você me veio com força e garra, maldito! Antes eu tivesse dormido toda a tarde do dia que beijou-me o restante da noite. Que difícil o controle dos sentimentos na manifestação desses. Que difícil a explicação do óbvio.
   ‘Amar sozinho, ai de quem ama’. Como se o amor fosse só tragédias. Não é, não! São uns detalhezinhos que mexem com todo o âmago de quem quer e de quem corresponde. É um emaranhado de suspiros que explodem em gestos únicos de mãos e cabelos e uma correspondência pacífica. Amar é esperar no mundo dos sorrisos, como se o amanhã não trouxesse as mais cruéis possibilidades.
     Mas é que sou tão ser humano quanto você Carlos! Por isso agi como agi num primeiro momento. Por pavor, pouco conhecimento de quem era, um mínimo de cautela. Depois te quis como uma criança pobre de fome e cuidados. E você, Carlos, me descuidou, me atrelou ao nada e preferiu o além. Foi com ela, e ela também foi contigo uma noite. Noutro, Carlos veio e eu matei nosso amor. E assim foi, leitor. Assim se foi.
   Então... Trouxe aqui dores minhas. Mas vá, não posso reclamar tanto assim, estive avisado do amor desde a época do Vinicius... Ai de quem ama/ Vive dizendo/ Adeus, adeus!
Adeus!
Adeus! 

3 comentários:

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  3. Não acredito em pessoas que se complementam. Acredito em pessoas que se somam.
    Às vezes você não consegue nem dar cem por cento de você para você mesmo, como cobrar cem por cento do outro?
    Existe gente que precisa da ausência para querer a presença.
    O ser humano não é absoluto. Ele titubeia, tem dúvidas e medos.
    Arnaldo Jabor.

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