sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

PENSAMENTOS #03

   


    Quando o temido dia chegar e as janelas do mundo se trancarem para o inédito e seus sonhos densos e cansados cessarem de voar... Quando esta data chegar, desista. E quando as folhas das árvores deixarem de cair no ritmo das estações e quando a vida passar a ter um único sentido, simplesmente desista. Quando perceber que se tornou tal qual seus pais e que suas roupas seguem a moda casual e que o cinismo, os bons modos e a etiqueta foram os únicos recursos que te sobraram, e quando usar desses meios não soar tão cruel, ah... realmente desista. Quando as fatalidades dos romances te forçarem abster-se de si e quando amar transformar-se em conveniência... Desista!
     Desista deveras quando essas mortes advirem, porque todas suas novas verdades serão as mesmas e velhas mentiras contadas. Desistir será sua única opção e concentrar-se vivo será seu objetivo. Tu deixarás de ser e passarás a estar, de tal ou tal maneira, desde que soe agradável ao espectador. Tudo será mero protocolo e provavelmente você encerrará sua existência preenchendo formulários. Por tudo isso, desista!
     Desista, sim, sem medo... Mas não de si! Desista de segui-los. Desista de acreditar que quando isso acontecer não terá volta e dê a volta por cima. Quando se sentir tão bobo e fraco a ponto de pensar em ceder, desista! Desista de permitir que se sinta assim. E quando julgar-se sozinho for tão insuportável, desista de criar sombras e crie relações. Quando seu reflexo finalmente te assustar, desista do que se fez e reinvente-se de novo. Desista da boa ética, desista de Deus, desista das dores, desista da paz. Por tudo isso, desista, será sua única opção.
     Não é indigno desistir. Indigno é tornar-se refém do caos, da ordem pré-estabelecida e das ideias implantadas. Sórdido é concordar com o influente por receio de desistir. Desistir do mau, das boas e costumeiras políticas é desistência fértil. Não é vergonhoso desistir. Vergonhoso é esquecer de se assumir e abdicar de se aceitar. Obscenidade é desistir da alegria e da busca. É irremediável desistir de viver. Desistir das decrépitas filas e procedimentos é mera renúncia da monotonia. Desista sempre que desistir lhe fizer um bem danado.
     E quando o temido dia chegar, das grandes depressões, de assaltos aos ânimos e falsas revoluções, e quando tiver certeza que a grande batalha chegou para você, desista! Não de lutar, sim de se render ao fantasioso. Por tudo isso, desista! Desista do que convir, sem medo... Mas não de si!  




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