Dói atirar ao alvo e errar. Dói
mais ainda tentar uma segunda, terceira, quarta, quinta vez e continuar
errando. Dói tanto as tentativas em falso que acreditamos não acreditar mais em
nós. A dor é tamanha que deixamos de existir, sumimos em si e nos outros.
Sumimos do mundo e dos desejos. Errar faz parte, mas dói. Perder as palavras ou
o controle delas é pior ainda. A dor faz isso, ranca os pedaços nos forçando
errar mais ao fazer o que não deveríamos, no impulso. Não adianta ser uma moça
transbordando carinho se não tem quem as tenha e as sinta. Não adianta ser e
não ter quem o tenha. Não adianta. Por isso dói, você desiste, se cega e cai na
armadilha todas às vezes. Você confia e acredita ter para si a maior
oportunidade da sua vida, logo, não pode perde-la. Daí você atira e... perde. É
doído, mas passa. E não tem quem mereça o mínimo, e não tem quem não mereça
amar e ser amado. E não tem quem mereça desistir antes de atirar. E por não ter
quem não mereça, não há quem o faça morto. Doer é natural, resignar-se não.
segunda-feira, 24 de abril de 2017
Liberdade em si
Senti uma vez a liberdade. Digo
liberdade no sentido ideal, até porque nem sempre conseguimos viver às margens
da realidade. Não descobri, no entanto, como previam, a solidão. Será mesmo uma
a ligação da outra? Senti uma vez. E bem naquele instante quis parar o mundo e
guarda-lo em mim para ser eu a morada das felicidades alheias. Quis eu amar
tudo e todos na imensidão das oportunidades e correr pelas beiradas das
correntezas. Troquei as fechaduras e me permiti arriscar não entrar em casa aquele dia. Não entrei. Fugi das preocupações e senti a liberdade ideal. Fugi
dele, dela, só pra sentir o sopro. Corri dos sentimentos conflituosos e decidi
resolve-los depois. E, quando o que aconteceu acontecera, quando aquele meu
segredo, meu eu, floriu, sorriu... sorri. E digo que, mesmo que eu e ela nos
desencontremos para todo o sempre, ainda sim senti eu uma vez e, mesmo que o
mundo desabe em rios de liberdade não ideal, eu terei experimentado a vida em
si.
domingo, 23 de abril de 2017
Tempo
Tempo, audacioso e volátil tempo.
Ouça meu discurso, compreenda meu desafogo. Isto é a fagulha quieta e chorosa
acerca de um futuro reinventado e compartilhado. Seja quem for, tempo, ‘tambor
de todos os ritmos’, aceite este prazer, porque é quase uma confissão seguida
de um pedido de remissão e paz.
E assim se dá.
De modo a trazer benefícios para
a raça, ou até que eu retorne à terra, adotei a antiajuda como guia das minhas
escolhas. Por acreditar que isso seja possível, desaprendi a ter nos olhos a
imagem da unicidade e especialidade daquilo que chamam de potencialidade
humana. Agora vivo assim, senhor bonito, às margens do amanhã.
E com tantas respostas saltando
do poço das ideias, sendo jogadas sem medo na face de quem aparece, refletir um
pouco sobre as indagações pode vir a ser, quem sabe, a chave da soberania. E ela
tem sido, quando atrelada à independência, essa tal para a sabedoria e o
caminho de cada verdade. Tem sido a existência existente para mim, desde que,
simploriamente notada.
E notei, confesso. Faz um tempo,
na verdade. Foi quando confundi liberdade e solidão. Quando partira tantos e
tantos dos meus que me vi sem ninguém, mesmo dentro da multidão. Quando me
perguntaram sobre a dor e eu não tive sequer a ânsia de arriscar uma frase
pronta. No desatino da confusão, acabei fugindo para um universo do outro, da
preocupação com o próximo, com os poucos.
Mas então, esqueci de cuidar de
mim. Desapareci. Senti que o tempo corria, que o tempo parava e que eu
simplesmente estagnava. E é normal? Sentir tudo assim? Livre. Solto. Bagunçado.
Disperso. Por acaso, é normal?
Só sei que deixei acontecer, como
acontece naturalmente a vida. ‘Dei tempo ao tempo, tempo demais’. Aí, tempo, eu
errei. Errei por gostar e gostar de menos. Consertei. Reacreditei. Decidi me
acertar. Pois tenho que me encontrar. E serei, se quiser, quando quiser.
Apesar disso, o excesso me cansou
e mesmo tudo sendo pouca coisa, quis voltar. Para me reanimar, pra entender a
mim e o fim. Para escutar, silenciar, permitir fotografar. Para achar no ‘mar
de indiferença o sol que faltava’. E mesmo que me faltasse mil razões, mesmo
que faltasse o ar e o prazer real, mesmo assim, teria voltado. Procuro
encontrar onde o tempo está. Então voltei.
Voltei para contar. Contar que tomei
conta do meu sorriso frouxo, dei corda às minhas ideias e permissão para seguir
meu nariz. Pausei a percepção do alheio e cavei fundo um túnel para dentro da
bolha da consciência. Estabeleci princípios humanos, reais, possíveis,
genéricos e, deixei passar vento pela janela do inesperado. Decidi mudar, tudo
e todos, se possível, se necessário, para me reconstituir, para me revestir e
reinventar. Ando sendo eu, sem muitos exageros ou especialidades. E se as forças-organizadores-com-divino-potencial-criador
decidirem, por acaso, me notificar, com certeza direi que ando sem tempo para
balelas, porque afinal, no final, ninguém vai pro céu.
sábado, 22 de abril de 2017
O que houve aqui?
É um tanto conflitante o desabafo
de quem vive os sentimentos encarnados no tempo em que eles se manifestam. O
extremo, o ápice, o clímax de qualquer manifestação de desejo inibe a máxima
tentativa de racionalização nas ações de busca ao prazer. Em síntese: um
processo de aprisionamento do indivíduo em questões ensimesmadas. Libertar-se é
negar a natureza humana e fingir-se divino. Não somos, no entanto. Meu cúmulo
de paixão, medo, sonho, tristeza, alegria, indagação, arrependimento, esperança,
levam-me à situações indesejáveis visto à lógica mundana e, o questionamento
impróprio de que se fiz o que fiz porque era-me o certo a fazer ou ainda se
deixei de fazer porque deixando me sentiria mais próxima das convenções, só
levaram-me ao ‘fundo do poço’.
Esse não é e nem tenta ser (e
ainda peço que não interpretem como tal) um discurso anarquista clássico ‘façam
o que desejam fazer’. Há normas, princípios, condições (mesmo no sentido não
alienante) de se fazer organizar e levar o mundo. Hoje, aqui, agora, o intuito
é falar sobre aquele sentimento que desencaminha qualquer tentativa mínima de manter-se
nítido, focado, limitado, vivo, dentro do juízo. Porque quando disse Vinicius ‘ai
de quem ama’ e ainda quando completa com tamanha lindeza ‘Amar sozinho/ Ai de
quem ama/ Vive dizendo/ Adeus, adeus’, nada mais fazia que rechaçar com a bomba
congelante de seus versos – o amor.
Trago ao leitor a comodidade de
assistir como mera ficção as dores intrínsecas dos amores finitos. Parto de mim, das dores minhas, únicas,
subjetivas, amargas, miúdas em suas grandezas. Traguei tanto da fumaça da
maldade, calei tanto sob o som da raiva. Chorei. Eu chorei tanto. É o que bem
disse acima: erro no uso da razão. Sem querer, acabei transformando as
calamidades da vida em poesia. Amar é também fazer isto.
Carlos. Vamos dar o nome de
Carlos ao sujeito. Carlos do germânico — o guerreiro. Nem soldado ou oficial,
um medroso. Fui persistente por ele e por nós. Carlos do germânico — o homem.
Homem, forte, protetor, amigo, amante. Quem dera! Carlos? Carlos de Carlos só
tinha o nome. Uma pena... Só serviu de objeto de estudo. Nada científico,
quanto menos as regras do positivismo mais válida minhas considerações. Dos
fatos ao ciúme, das crises às conclusões: vive dizendo adeus, adeus!
É...Ai de quem ama. E eu amei. Ai de
mim! Pensava na melodia do Vinicius cada vez que ele vinha, todo Carlos, me
fazendo esmorecer. Nada guerreiro, mas forçando-me à amar-lhe. Amei Carlos, com
todas as forças. Carlos não via. Me dedicava tanto. Tanto. E eu questionando-me
do que o amor fizera por aqui. Antes eu tivesse desviado dos teus olhares e me
esquivado dos teus abraços. Se soubesse do trágico fim, tornava à próxima
esquina para que não me visse, para que sumisse do meu destino. Antes eu estivesse
solitária nas imaginárias declarações de Mr. Darcys, Johns e Wethers do que no
apreciar da sua deliciosa voz. Carlos, como pôde ser tão estúpido? O que o amor
fez por aqui? Antes eu o temesse como temi os homens da vida. Você me veio com
força e garra, maldito! Antes eu tivesse dormido toda a tarde do dia que
beijou-me o restante da noite. Que difícil o controle dos sentimentos na
manifestação desses. Que difícil a explicação do óbvio.
‘Amar sozinho, ai de quem ama’.
Como se o amor fosse só tragédias. Não é, não! São uns detalhezinhos que mexem
com todo o âmago de quem quer e de quem corresponde. É um emaranhado de
suspiros que explodem em gestos únicos de mãos e cabelos e uma correspondência
pacífica. Amar é esperar no mundo dos sorrisos, como se o amanhã não trouxesse
as mais cruéis possibilidades.
Mas é que sou tão ser humano
quanto você Carlos! Por isso agi como agi num primeiro momento. Por pavor, pouco
conhecimento de quem era, um mínimo de cautela. Depois te quis como uma criança
pobre de fome e cuidados. E você, Carlos, me descuidou, me atrelou ao nada e preferiu o além. Foi com ela, e ela também foi contigo uma noite. Noutro, Carlos veio e eu matei nosso amor. E assim foi, leitor. Assim se foi.
Então... Trouxe aqui dores minhas. Mas vá, não posso reclamar tanto assim, estive avisado do amor desde a época do Vinicius... Ai de quem ama/ Vive dizendo/ Adeus, adeus! Adeus! Adeus!